A Igreja de Jesus Cristo-Uma Perspectiva Histórico-Profética

A Igreja de Jesus Cristo-Uma Perspectiva Histórico-Profética
Tradução do livro "La Iglesia de Jesucristo, una perspectiva histórico-profética" de Arcadio Sierra Diaz

sábado, 26 de janeiro de 2008

V- Sardes ( 1ª Parte )

Capítulo V SARDES
(1a. parte)


SINOPSE DE SARDES

Os refugiados do cativeiro da grande prostituta

-Começa a restauração da casa de Deus - O renascimento e a invenção da imprensa por João Gutemberg.

Martinho Lutero e a Reforma protestante

O comércio de indulgências - As 95 teses de Lutero - O enfrentamento com o papado romano - Leão X e Carlos V - A Dieta de Worms - Felipe Melanchton.

O Nascimento das "igrejas nacionais"

-Na Alemanha com Martinho Lutero - Na Suíça com Ulrico Zwinglio e João Calvino - Na França com Jacob Lefèvre d’Etaples - Ns Escócia com João Knox - Na Inglaterra com Henrique VIII - A paz de Westfália.

O florescimento do protestantismo

-Das "igrejas nacionais" desprende-se as grandes denominacões: Anabatistas - Menonitas - Puritanos - Batistas - Quaquers - Presbiterianos - Metodistas – Fazia os Primeiros passos o ecumenismo final.

Os vencedores de Sardes

-Quinta recompensa: Serão vestidos com vestiduras brancas. Seu nome não será apagado do livro da vida ante o tribunal de Cristo em Sua vinda; ao contrário, o Senhor confessará seus nomes diante do Pai celestial e de Seus anjos.

A CARTA A SARDES

"1 Ao anjo da igreja em Sardes escreve: Estas coisas diz aquele que tem os sete Espíritos de Deus e as sete estrelas: Conheço as tuas obras, que tens nome de que vives e estás morto.2 Sê vigilante e consolida o resto que estava para morrer, porque não tenho achado íntegras as tuas obras na presença do meu Deus. 3 Lembra-te, pois, do que tens recebido e ouvido, guarda-o e arrepende-te. Porquanto, se não vigiares, virei como ladrão, e não conhecerás de modo algum em que hora virei contra ti. 4 Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que não contaminaram as suas vestiduras e andarão de branco junto comigo, pois são dignas. 5 O vencedor será assim vestido de vestiduras brancas, e de modo nenhum apagarei o seu nome do Livro da Vida; pelo contrário, confessarei o seu nome diante de meu Pai e diante dos seus anjos.6 Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas." (Ap. 3:1-6).

Os refugiados de Tiatira

A localidade de Sardes havia sido a capital da Lídia, na Ásia Menor. Lídia foi uma nação rica em ouro, mas por essa mesma riqueza lhe sobreveio a perdição, pois foi presa da cobiça dos governantes poderosos. Creso, seu último rei, foi levado cativo por Ciro, o rei persa, em 546 a. C. Nos tempos do apóstolo João, Lídia, incluída sua capital Sardes, fazia parte da província romana da Ásia. Hoje dessa cidade só restaram ruínas. A igreja nessa localidade tipifica o quinto período profético da história da Igreja de Jesus Cristo durante sua peregrinação terrena, o qual historicamente começa desde o inicio da Reforma, 31 de outubro de 1517 quando Martinho Lutero cravou suas 95 teses na porta do templo de Wittenberg, até a eventual vinda do Senhor. O nome de Sardes significa os escapados, aqueles que saíram, o remanescente, o restante e também, restauração. Tem isto alguma relação com este período? Muito. Desde o primeiro período, Éfeso, a Igreja vinha caindo, desmoronando. Na era apostólica começa a perder o primeiro amor e surge a obra dos nicolaítas, logo se une em matrimônio com o Estado e a religião babilônica e o resultado é um sistema medieval absolutista, despótico, cruel e corrupto ao que a Bíblia chama de a profetisa Jezabel, que se confunde com o catolicismo romano, e que temos analisado em Tiatira; mas em todos os períodos tem havido vencedores, santos valentes que o Senhor tem fortalecido e guardado, e em Tiatira temos visto alguns dos santos que se opuseram à prostituta e prepararam o caminho para que outra geração de vencedores pudera escapar desse abominável sistema, e por meio deles, o Senhor começou a restaurar as coisas que se haviam perdido e é o começo do que historicamente se conhece como a Reforma, em parte política e em parte religiosa, pois a igreja apóstata se havia convertido em uma mescla de ambas as coisas, efeito do seio do catolicismo surgiu um remanescente, os protestantes. Saíram desse sistema religioso tirânico e corrupto, como um começo da obediência ao chamado de Deus de Apocalipse 18:4. Os refugiados estavam convencidos de que o sistema católico romano do qual saíam havia se convertido em herético, por quanto haviam posto como autoridade da igreja ao papa e aos concílios por cima da autoridade normativa da Palavra de Deus, e haviam se apartado de seus princípios, invalidando as Escrituras com doutrinas de invenção humana. Mas o fenômeno foi que na prática sucedeu o contrário, pois o papado mandou à fogueira a milhões de protestantes, acusando-los de hereges. Como explicamos no capítulo anterior, a partir de Tiatira ocorre um fenômeno importante que merece reconhecimento, e é que Tiatira não deixa de existir até a vinda do Senhor, e Sardes sai de Tiatira, sucedendo sem que necessariamente a substitua. Tenha-se em conta que na carta a Tiatira se menciona a grande tribulação e silenciosamente a vinda do Senhor. Quando se cumpriram os 70 anos de cativeiro babilônico dos hebreus, o Senhor não conduziu de novo á Terra Santa a todo o povo, senão somente a um remanescente fiel para que realizasse os trabalhos de recuperação e reconstrução do templo, de Jerusalém e da nação, pois tudo havia ficado em ruínas. Nos tempos do profeta Zacarias e Ageu, por um edito do rei Ciro da Pérsia, regressou à terra de Judá um remanescente, alguns dizem que de umas quarenta mil pessoas, dos que haviam sido levados em cativeiro a Babilônia. Para que dirigisse o regresso, Deus havia escolhido a Zorobabel filho de Salatiel, o governador de Judá, e a Josué filho de Jozadaque, o sumo sacerdote, para que começassem a reedificar a casa de Deus e a cidade. O Que significa que haja escolhido esses dois varões simbólicos? O Zorobabel representava a autoridade de Deus, pois era quem levava a semente de Davi e era o herdeiro do trono, e Josué vinha da linha do sacerdócio Aarônico; de maneira que eram as duas oliveiras que pôs Deus a cada lado do candeeiro, para a restauração de tudo na casa de Deus. Mas para que isso ocorresse foi necessário que o Senhor despertasse o espírito tanto dos líderes como do resto do remanescente, para que se dispusessem nos trabalhos da restauração da casa do Senhor. Sem a obra do Espírito Santo em nosso espírito não pode realizar nada. Eles começaram os trabalhos de reedificação e foram postos os fundamentos do Templo, mas a obra se viu demorada devido ao fustigamento e maquinações dos vizinhos e samaritanos hostis, inimigos de que se restaurasse a casa do Senhor e houvesse um avivamento no povo de Deus. Quando em Jerusalém começaram esses trabalhos de restauração e reconstrução nos tempos de Esdras e Neemias, houve muita oposição por parte dos inimigos do povo de Deus, mas Deus reagiu, os fortaleceu, os animou e com Seu poder, apoiou a valentia que lhes infundiu, aquela restituição das coisas perdidas seguiu adiante nessa geração. Isso tipifica o que ocorre com a Igreja aos finais da Idade Média. Depois que o papado romano havia retido cativa à Igreja, chega o momento que um remanescente, uma minoria de crentes, escapa da nova Babilônia. Alem dos pré-reformadores mencionados, o Senhor permitiu que nos fins da Idade Média sucedessem na história certos feitos, circunstâncias e mudanças notáveis na sociedade, que em seu momento também constituíram forças para o surgimento e desenvolvimento da Reforma protestante, como o Renascimento. O Renascimento com suas tendências paganizadoras e seu humanismo descristianizante, em contraste com o escolasticismo do medieval, surge como um movimento mais secular ou temporal que religioso, no qual consagrados eruditos se inclinaram pelo culto à Antigüidade greco-latina, ao estudo e imitação dos autores clássicos, e ao cultivo da arte, o estudo do grego, o latim e outras disciplinas de tipo investigativo e que incentivaram as origens da ciência moderna. O Renascimento se desenrola aproximadamente no lapso compreendido entre os anos 1450 a 1570, tempo no qual é inventada a imprensa, pelo ourives alemão João Gutenberg, em 1455, e cujo primeiro livro impresso, para a glória de Deus, foi a Bíblia, deixando assim de ser as Sagradas Escrituras monopólio de uns poucos privilegiados, para vir a ser, traduzida às línguas vernáculas européias, de uso comum, pelo que tudo ele ia incentivando o fogo da Reforma, pois a gente, ao ler o Novo Testamento e os escritos dos reformadores, pode entender o distante que estava o papado romano dos ensinamentos da Palavra de Deus. Vemos aqui que uma das primeiras coisas restauradas por Deus em Sardes foi o voltar à leitura, ao conhecimento e prática da Palavra de Deus. Recorde-se que o Senhor se apresenta à igreja em Pérgamo como " o que tem a espada afiada de dois gumes ", a qual usa para cortar essa espúria união de sua Igreja com o mundo.No período de Tiatira a Igreja havia institucionalizado tanto, que havia esquecido o evangelho, e ao deixar o evangelho de Jesus Cristo, se havia esquecido do método de Deus para Sua Igreja, havia descuidado sua única organização corporativa, sua única forma de vida, a vida do Corpo, sua única Cabeça, sua única forma de governo para a igreja em cada localidade; se havia esquecido dos meios evangélicos para pregar, educar e cultivar nas almas o conhecimento do depósito deixado pelo Senhor. A institucionalizada igreja apóstata de Tiatira se identifica com a noite dos tempos, na qual até a Bíblia deixou de ser de circulação autorizada, por ordem do autodenominado "servo dos servos do Senhor".

Começa a restauração da casa de Deus

" Ao anjo da igreja em Sardes escreve: Estas coisas diz aquele que tem os sete Espíritos de Deus e as sete estrelas: Conheço as tuas obras, que tens nome de que vives e estás morto. ".A igreja de Sardes guarda alguma semelhança com a de Éfeso. Observe-se que em ambas o Senhor se apresenta como o que tem as sete estrelas. Em Éfeso para cuidar a igreja e encher-la de Sua graça; em Sardes para trazer à igreja Sua luz e ela volte a brilhar intensamente, a iluminar na escuridão e não se perca o que está a ponto de morrer. É o mesmo imutável Senhor que, havendo falado a uma igreja que por haver perdido o primeiro amor não fazia as primeiras obras, agora a encontra com o nome de que vive, mas que está morta, como uma conseqüência de uma deterioração. Os sete Espíritos de Deus servem a Sardes para que tenha vida intensa. Se em Éfeso começa a degradação na Igreja, em Sardes começa as bases da recuperação do que praticamente já estava em ruínas. Em termos gerais tudo estava praticamente coberto por um negro manto de obscuridade, e vem o Senhor e se anuncia como o que tem as sete estrelas para iluminar a Igreja e mostrar o caminho de um avivamento. Mas também se apresenta como o que tem os sete Espíritos de Deus, significando a totalidade da poderosa, oportuna e importante intervenção do Espírito Santo, para dar vida ao morto, para iluminar à gente no entendimento da Palavra de Deus e sua devida e valorosa fidelidade à vontade do Senhor nesses tempos decisivos, frente a uma poderosa e institucionalizada oposição satânica. O Espírito de Deus sete vezes intensificado, dando vida à Igreja, "porque a letra mata, mas o espírito vivifica." (2 Co. 3:6b).O que significa que Sardes tenha nome de que vive, mas que está morta? A resposta a daremos no desenvolvimento e comentário dos acontecimentos históricos em torno ao protestantismo reformado. O período profético de Sardes representa a igreja protestante, cuja característica principal é que tem nome de que vive, mas que está morta, e ao estar morta, necessita de vida espiritual, a vida dos sete Espíritos viventes de Deus e as resplandecentes estrelas, no número da plenitude. Sardes tem nome de que vive e está morta devido a que a Reforma foi mais de forma que de fundo, de nome que de vida, pois a verdadeira reforma só vem da união com o Salvador e a busca de Sua glória. Na Reforma se mesclaram interesses que não necessariamente eram os do Senhor. A Reforma foi mais objetiva que subjetiva.No protestantismo não há unidade porque suas distintas divisões não tem devidamente definida uma clara doutrina eclesiológica, e constitui uma grande verdade que para muitos líderes e pregadores protestantes se faz confuso entender com a necessária nitidez o conceito bíblico de igreja e como se identifica a Igreja objetivamente. O catolicismo romano se ufana de sua impressionante estrutura, mas o protestantismo faz outro tanto ainda em meio da proliferação de milhares de denominações, às vezes estrutural, governativamente e até doutrinalmente tão diferentes, que um se pergunta que parte da Bíblia particularmente têm preferido destacar em detrimento do resto das Escrituras, fomentando cada dia mais o caos e o desacordo.Poderíamos pensar que o catolicismo romano degenerou até chegar a ser um remendo caricaturesco da Igreja do Senhor, e tanto o sistema católico romano, como os sistemas ortodoxos orientais, a igreja cristã copta do Egito e outros, representam algo menos que a Igreja do Senhor. Mas, como o veremos mais adiante, o protestantismo fabricou seus pequenos reinos "papais" adotando nomes próprios diferentes do nome do Senhor, são todos sistemas, menos Igreja do Senhor! O catolicismo romano, não obstante sua pretendida unidade, destruiu a comunidade cristã, mas o protestantismo não têm feito nada para recobrar; porque se pode pregar que te salvas pela graça de Deus e não por teus méritos pessoais, mas se pode te proibir ter comunhão e ainda que partas o pão com teus irmãos pelo fato de não pertencer a tua mesma bandeira doutrinal e nominal. Quando não há unidade no corpo não pode haver manifestação de vida, daí que o Senhor se apresente como o que tem os sete Espíritos de Deus, para que se possa fazer as obras da vida. Mesmo com o surgimento de movimentos pentecostais e carismáticos a situação em Sardes é a mesma. Das coisas que se foram restaurando em Sardes, ou pelo menos se iniciou sua restauração, temos as normas e autoridade da Bíblia, a justificação pela fé, o sacerdócio de todos os santos e o se submeter à autoridade do Senhor acima de toda outra autoridade, do contrário não podia dar-se restauração alguma. Sardes representa a igreja protestante; em Sardes se inicia a Reforma mas não se completa. Inclusive coisas que se restauraram, como o sacerdócio de todos os santos, voltaram atrás no desenvolvimento do protestantismo; a Bíblia havia sido o livro selado durante mil anos, e os reformadores a voltaram ao povo, mas sem infundir-lhes o amor por sua leitura; daí que o cristão protestante a tem mas não a lê. Uma coisa é ter a Palavra de Deus na mão e ler para discutir, e outra diferente é tê-la no coração, vivê-la ou aplicá-la à vida. O protestantismo insistiu na justificação pela fé, mas na prática negando sua eficácia, de tal maneira que muitos carecendo da fé, estão impossibilitados de fazer boas obras. Tenhamos em conta que de acordo com o espírito da época, o movimento protestante ao iniciar tendia mais a sacudir-se do jugo político que à obra regeneradora de Deus. Aos olhos de Deus, a Reforma foi pois considerada morta.Nada põe em tela de juízo que Lutero era um homem de Deus, guiado abaixo a magnífica revelação de Deus para fazer a vontade de Deus para a restauração de Sua Igreja, em Sua reação ante Tiatira. A intenção de Lutero foi a reforma da única Igreja de Cristo e se afirma que nunca houvesse permitido a criação de igrejas luteranas, mas desde os albores da Reforma se vislumbrou as diferenças de critérios dos reformadores, diferenças que geraram distintas perspectivas protestantes: luteranos, calvinistas, zwinglianos, anglicanos, por não mencionar senão aos exponentes mais proeminentes; e os esforços por reconciliar essas facções, ao mais produziram conjunturais "igrejas" nacionais, por muito que não hajam querido fomentar cismas e divisões.Essas igrejas nacionais com freqüência assumiam diferentes características e conformações: Luterana na Alemanha, presbiteriana na Escócia, episcopal na Inglaterra, mistas em outros países. Ao anterior contribuiu muito o fato de que os governantes europeus aproveitaram conjunturalmente a Reforma religiosa para sacudirem-se da opressão e jugo do poder romano papista, de tal forma que, além da força de Deus, operou a do homem; de maneira que foi uma reforma política à vez que religiosa, pois o sistema católico se havia convertido em um poder político religioso. Martinho Lutero foi o servo usado por Deus, infundido de tal fé que, animado pelo Espírito Santo, ainda se vendo só, se manteve fiel a Deus e firme contra todo esse poderio da cúria romana de seu tempo. No capítulo anterior vimos como a fé, a atividade e o testemunho dos pré-reformadores como os valdenses, os hussitas, os lolardos, foram decisivos para a Reforma e a formação do que chamamos o protestantismo. Também contribuíram para a tradução, impressão e divulgação da Bíblia, a teologia mesma de Agostinho já enfocada abaixo de uma lente mais escrituraria o humanismo renascentista, o nacionalismo que via não muito bem que poderes estrangeiros estivessem manipulando os assuntos eclesiásticos e o desvio de dinheiro para Roma, e sem lugar às dúvidas o surgimento na sociedade de um novo elemento, a burguesia, ou classe média. O protestantismo surge quase simultaneamente em vários países europeus; de seus principais líderes faremos um pequeno perfil, sendo Lutero indiscutivelmente a figura proeminente.

Lutero e a Reforma

Martinho Lutero (Luther) (1483-1546). Nasceu este alemão em Eisleben (Turíngia) em 10 de novembro de 1483, no lugar de trabalho do setor rural envolto nessa atmosfera religiosa comum à época; seu pai chegou a ser um folgado mineiro que se interessou na educação de Martinho, com o desejo de que chegasse a ser um brilhante jurisconsulto. De acordo com o espírito da época, o jovem Martinho foi educado no temor de Deus, na crença da existência do céu, do inferno, dos santos, dos anjos e demônios. Cresceu com aquele infundado terror a Cristo como juiz, o qual cria atenuar crendo na eficaz intercessão da virgem Maria e os santos. Adiantou sua educação primaria em Mansfield e Watterburgo, e logo passou à escola superior de São Jorge, em Eisenach. Em abril de 1501 iniciou estudos de letras na Universidade de Erfurt: retórica, dialética e lógica, vendo também física e astronomia, clássicos latinos (Cícero, Tito Lívio, Virgílio). Brilhante estudante, em 1502 recebe o grau de formado em Artes Livres, e em 1505 o de mestre em Artes Livres, havendo cursado outras matérias, mas fazendo ênfases nos ensinamentos filosóficos de Aristóteles (metafísica, ética, política, economia).Seu pai estava esperançado em que continuasse estudando jurisprudência, mas ocorreu em sua vida um giro inesperado. Certo dia regressava de sua casa à Universidade de Erfurt, e havendo anoitecido, lhe surpreendeu uma pavorosa tormenta e um raio matou a um companheiro, pelo que cheio de temor caiu em terra e gritou a Santa Ana, a padroeira dos mineiros: "Ajuda-me e te prometo fazer-me monge", e sem consultar a seus pais ingressou à ordem dos agostinos eremitas em Erfurt. Em 1507 é ordenado sacerdote; estuda teologia, e 1508 passou à Universidade de Wittenberg, no eleitorado de Saxônia, para ensinar ética aristotélica, por convite de João Staupitz, general dos agostinos, quem também e anima a preparar-se para o doutorado. Indiscutivelmente Lutero foi influenciado pela linha escolástica de Ocam. Em Lutero se da um escalonamento de sucessos concatenados entre si. Levemos em conta que não era sua intenção fazer-se monge, mas a experiência da tormenta que o enche de temor de morrer e ir pro inferno, lhe faz fazer um voto à "padroeira" de seu pai, e ingressa no monastério, mas esse passo transcendental com suas implícitas e posteriores rígidas normas de vida não satisfez seus temores, e vemos a mão do Senhor o guiando, permitindo essas lutas vivenciais; vivia uma permanente luta interior, pois a vida monástica não lhe proporcionou a segurança da salvação que tanto almejava, e procurava por todos os meios infundidos na época fazer-se adepto a Deus e merecer a salvação, pelo que continuaram com maior rigor suas interrogantes relativas a sua própria salvação.Conforme os ensinamentos doutrinais de sua época, Lutero se questionava, Como posso eu, miserável pecador, ser justificado ante um Deus santo? Como posso eu obter mérito suficiente para alcançar o céu? De acordo com essas doutrinas de tipo teológico da época, também se perguntava, será certo que me possa servir as penitencias, a mortificação da carne, as indulgências e a prática dos sacramentos? Ao não obter resposta satisfatória, que segue depois? Estando nesse meio monacal e universitário relacionado com a teologia, tem a oportunidade de estudar as Sagradas Escrituras e de chegar ao entendimento do evangelho, e por esse entendimento da Palavra de Deus chegou ao convencimento de que o justo vive pela fé e não pelas obras, assim se chamem indulgências, mortificação da carne, peregrinações, o recorrer aos sacramentos como meios de graça, conhecimento e entendimento ao que chegou particularmente por meio do estudo da epístola de Paulo aos Romanos. Em 1510 viaja a Roma por assuntos de sua ordem religiosa, mas depois de haver presenciado o ambiente de corrupção moral e a indiferença espiritual em que estava imersa a corte papal aumentou sua angustia e aflição. Em 1511, de novo em Wittenberg retomou seus estudos para o doutorado: Obras de Ocam, d’Ailly, Gabriel Biel, Agostinho, Bernardo de Claraval, Tomás de Aquino, Gerson. Em 1512 é nomeado supervisor dos agostinos em Wittenberg e recebe seu doutorado em Teologia, iniciando-se como professor das Sagradas Escrituras. Aceitou impressionado e mesmo com suas reservas a doutrina da predestinação, pois até certo tempo de sua vida tinha seus conflitos com o Senhor. Havia aprendido que se o homem voluntariamente cooperava com a graça, podia chegar a merecer o céu; cooperação que enfatizava o freqüentar os sacramentos e demais artifícios mediadores de graça. As lutas deste monge agostiniano eram intermináveis, e nem as melhores obras ajudadas por meio de graça, nem o estudo desses grandes teólogos, nem sua vida monacal e todos esses recursos, não faziam senão afunda-lo mais no desespero, pois continuamente sentia que seus pecados o afastavam cada vez mais de um Deus três vezes santo. Mais tarde escreveria: "Tratar de manter-se em pé com as próprias forças é o erro no qual também eu estive". Mas em sua condição de professor das Sagradas Escrituras, a partir de 1513 tem a oportunidade de desenvolver uma série de cursos bíblicos sobre os Salmos, a epístola aos Romanos, aos Gálatas e Hebreus, e "descobre" a justificação pela fé (cfr. Romanos 1:17), e que o homem se salva pela livre graça de Deus, sem que haja nenhum mérito pela parte humana. Assim começa a afastar-se da teologia escolástica. Em Lutero, pois, tem vindo dando-se três aspectos nesse crucial processo: a vivência e busca religiosa, a formação científica e a experiência de fé. Desde criança lhe haviam ensinado a ver em Cristo como juiz, mas chegou o tempo de ver na cruz, Deus reconciliando o mundo consigo mesmo pela obra de Seu Filho. Uma vez que Lutero teve a suficiente luz escrituraria em relação com a salvação, começou a compartilhar em seus ensinamentos e a manifestar-se nos círculos universitários contra a obscura doutrina em torno às indulgências, e foi recebendo a solidariedade de seus colegas. Mas o que levou Lutero ao conflito com Roma foi de índole de autoridade mais que de doutrina. Era tanta a arrogância pontifical, que de momento o Vaticano não o olhava senão como a um herege que punha em dúvida sua autoridade, pois, como já antes o haviam declarado vários teólogos do porte de Guilherme de Ocam e Gabriel Biel (1420-1495), Lutero afirmou a autoridade das Escrituras por cima da autoridade da igreja, do papa e dos concílios eclesiásticos. Lutero compreendeu que as Escrituras tem uma perspectiva cristocentrica, e como tal são as que normalizam o caminho verdadeiro da salvação, e tudo o que sai de suas vias e não esteja de acordo com a Bíblia, não tem validade. A canonicidade das Escrituras não depende da aprovação da Igreja, porque a Igreja está fundamentada sobre as Escrituras e não as Escrituras sobre a Igreja. A autoridade das Escrituras se fundamentam em que Deus é Seu autor, e só por isso. Não se pode negar a autenticidade das Escrituras; ou seja , que podem ser entendidas por qualquer santo que se interesse em conhece-la, e para ele o Senhor proporciona a ajuda pedagógica da unção do Espírito Santo. É interessante saber que as passagens claras da Bíblia podem esclarecer os obscuros e aparentemente difíceis. A Escritura não necessita da interpretação e magistério oficial da Igreja, pois isso implica colocar a Igreja por cima das Escrituras (cfr. Ef 2:20; Ro 1:17; Jo 2:20,27).

As indulgências para São Pedro


Não obstante os ventos de reforma e de independência que se vinha respirando na Europa nos tempos em que Lutero ensinava na Universidade de Wittenberg, ainda se desejava sentir a intolerância e o absolutismo, e é quando surge em Roma a necessidade de ingentes somas de dinheiro para terminar a construção da catedral de São Pedro. O que seria melhor que coletar vendendo indulgências por toda a Europa? Já temos comentado que a Bíblia foi por muito tempo um livro de circulação e leitura proibida, e as pessoas, ao desconhecer as Sagradas Escrituras, cria nas mentiras difundidas pelo papado, até o ponto de que governantes como Frederico o Sábio, eleitor da Saxônia, também se beneficiavam com o tráfico de indulgências. Por exemplo, no templo do castelo de Wittenberg, o eleitor da Saxônia expunha suas próprias relíquias e obtinha benefícios por quanto havia arraigado entre as pessoas a falsidade de que quem olhasse e venerasse devotadamente essas relíquias no dia de todos os Santos aos fins de outubro, recebia uma remissão plena de toda pena temporal, de tal maneira que ficava livre de sofrer as penas do purgatório. Entre essas relíquias supostamente se encontravam, entre outras coisas, típicas palhas do presépio de Belém, como também uma garrafinha que continha três gotas do leite do seio da Virgem Maria. Mas para tal data do ano 1517, não compareceu a Wittenberg o número esperado de peregrinos e camponeses, pois surgiu a competência originada desde Roma. Por essas mesmas calendas o florentino João de Médici (1475-1521), filho do banqueiro Lorenzo o Magnífico, ocupava o cargo de papa com o nome de Leão X, e quis girar sobre a famosa tesouraria dos santos com o fim de remeter as penas temporais pelo pecado de muitos europeus, tanto dos vivos como das almas de amigos e parentes que estivessem no purgatório, e de passo obter ganâncias com o comércio dessas indulgências, indispensáveis fontes de renda. Leve-se em conta que este sagaz e maquiavélico político renascentista foi feito sacerdote aos oito anos, diácono cardeal aos treze, e durante seu pontificado foi aumentado a corrupção do papado. Não era homem capaz de compreender o alcance e o significado espiritual do movimento que Lutero liderou em seu tempo. Leão X solicitou a Alberto de Brandenburgo, banqueiro da aristocrática família de Hohenzollern, que se encarregara da venda das indulgências na Alemanha com um benefício de 50%, o qual ia a aplicar à dívida que na ocasião Alberto havia adquirido com o papado pela compra do cargo de arcebispo de Maguncia, o cargo eclesiástico mais elevado na Alemanha.Por delegação do arcebispo, na prática no território alemão o vendedor principal era o dominico João Tetzel, quem astutamente as oferecia dizendo que "tão logo cai a moeda que se deposita no cofre, a alma de seus defuntos parentes sai voando do purgatório ao céu", ou com a virtude de conceder perdão de todo pecado das pessoas em cujo favor fossem comprados esses certificados assinados pelo papa.

O Conflito de Roma

Quando Lutero se informou que muitos haviam comparecido a lugares vizinhos pra comprar indulgências papais, decidiu fazer pública a ineficácia desses meios tão alheios à graça de Deus e os méritos do Senhor Jesus Cristo, e o dia 31 de outubro de 1517, data que se tem assinalado como o começo da reforma protestante, Lutero cravou na porta da capela do Castelo de Wittenberg, que servia também como mural de notícias da Universidade, as 95 teses ou declarações debatendo as indulgências, advertindo o perigo que encerravam para as almas dos fiéis. Inicialmente os protestantes reformadores não tiveram a intenção de romper com o catolicismo romano, nem se consideravam uns inovadores, senão reformadores; parece que os animava o desejo de purificar à Igreja das mesmas corrupções das que acusavam à hierarquia romana. Ao parecer, era um movimento visando a voltar ás fontes da mais pura fé cristã.Nas 95 teses Lutero não ataca pessoalmente ao papa, senão que vê no comércio das indulgências um menosprezo da reputação papal, mas essas declarações tem a contundência suficiente como para enfurecer ao arcebispo de Maguncia e a Tetzel. Há de se levar em conta que mais que uma reação pastoral, a intenção de Lutero foi suscitar um debate de tipo acadêmico a nível universitário, sem que deixasse de ser o primeiro, mas no fundo se converteu em um desafio à questão das indulgências e à autoridade papal (se pode ler o texto das 95 teses no apêndice do presente capítulo).Sem que Lutero se propusesse, em poucos meses as 95 teses foram impressas e difundidas por toda Alemanha não só em seu latim original, mas também traduzidas ao idioma vernáculo, e ele ocasionou como conseqüência que Lutero se via envolto em uma controvérsia, e o problema fora levado até Roma. No princípio Leão X não deu muita atenção no assunto, entendendo ser ele como uma disputa entre dominicos e agostinos, ocupado como estava na política italiana, conformando-se por momento com ordenar ao diretor dos agostinos que fizesse calar a este frade; mas um conselheiro papal, o dominico Silvestre Prierias, ao invés de enfrentar um debate de tipo ideológico, teológico e doutrinário, escreveu um Diálogo sobre a Autoridade do Papa, logrando que o papa citara a Lutero em Roma no verão de 1518, para que respondesse aos cargos de heresia e contumácia, pois aquele foi considerado somente desde o ponto de vista da autoridade papal. Então Lutero fez saber ao eleitor Frederico e ao imperador Maximiliano que aquilo significava um ataque aos direitos das universidades alemãs, e o mesmo imperador se encarregou de recomendar prudência ao papa, quem conveio que a audiência se trasladasse a Augsburgo (Alemanha) onde estava reunida a Dieta imperial (Reichtag), enviando como seu representante a Tomás de Vío, conhecido como o Cardeal Cayetano, diante do qual Lutero se negou a retratar-se.Apesar destes acontecimentos, o papa procurava assumir uma atitude conciliatória a fim de conservar a boa vontade do eleitor Frederico, e ante Miltitz, o novo legado papal, Lutero deu mostras de abster-se do debate se seus contrários também tomassem a mesma atitude, mas os dominicos que criticavam a Lutero tornavam mais forte o ataque, e por outro lado, professores destacados da universidade de Wittenberg saíram em defesa do reformador, como o jovem professor humanista Felipe Melanchthon (1497-1560).Lutero queria evitar a ruptura com Roma, e ele mesmo disse: "Nunca tive a intenção de combater a igreja romana, e não ponho nada por cima dela, nem no céu nem na terra". Inclusive no começo pensou que o papa lhe daria razão. Isto é importante ponderar devido a que Lutero tem sido acusado desde os círculos do catolicismo romano, de que, vendo as misérias e pecados da Igreja Romana, ao invés de contribuir com a reforma da Igreja Católica Romana, decidiu romper com a mesma, e promover uma reforma de fora. Isso não é verdade! A auto-suficiência e a soberba de uma instituição cega, o tem proclamado assim. Foi ao contrário; não podiam suportar a alguém que desafiasse a autoridade dos magnatas que ostentavam tal poder religioso no mundo. Se Lutero não houvesse tido algum respaldo dos poderosos da Alemanha em seu tempo, o sistema católico romano já o havia mandado à fogueira exatamente como a Huss em Constança. Os acontecimentos foram se dando de tal maneira, que o legado papal se apercebeu de
que tudo aquilo havia sido aproveitado para convertê-lo em um movimento nacional contra Roma. Muitos príncipes se puseram do lado da causa protestante e se aproveitaram conjunturalmente da mesma para seus próprios fins políticos.Em 1519 teve lugar em Leipzig um debate diante de um numeroso auditório entre Lutero e alguns de seus colegas como Melanchthon, frente ao teólogo João Eck, no qual ficou claro que Lutero admitiu como cristãs e evangélicas alguns dos ensinamentos de João Huss, que os concílios eram falíveis, que os artigos de fé se devem derivar das Escrituras e não podiam ser estabelecidos pelo papa nem pela Igreja, ficando convencido além disso de que entre Bíblia e a teologia escolástica as separava um abismo. Cada dia mais o povo e muitos nobres apoiavam a Lutero. Este pôs o ponto final para que o 15 de junho de 1520, Leão X excomungasse a Lutero e quatro de seus companheiros, e condenando seus escritos, mediante a bula Exurge Domine, a qual começa dizendo: "Levanta-te, Senhor, e julga tua causa. Um Javali têm invadido tua vinha". Mas Lutero queimou publicamente o que chamou "a bula execrável do anticristo", protocolizando o rompimento definitivo de Lutero com o catolicismo romano.Nesse mesmo ano Lutero escreveu os seguintes importantes tratados:- O Sermão sobre Boas Obras, em oposição às obras obrigadas para salvação de seu tempo, declarando que "a mais nobre das boas obras é crer em Cristo".- O Papado em Roma. Obra publicada em 1520, por meio da qual Lutero vai publicando mais seu conceito de Igreja, considerando-la como a assembléia espiritual de todos os crentes unidos em Cristo em toda a terra, onde recusa uma cabeça humana (o papa).- O Discurso à Nobreza Germânica. É um forte ataque contra o papado romano. Entre outras coisas diz que o papado tem edificado três muralhas protetoras em menosprezo do verdadeiro cristianismo: A primeira, a superioridade dos papas e o clero em geral sobre os laicos, em detrimento do bíblico sacerdócio de todos os crentes. A segunda, que o papa se adotou do direito exclusivo de interpretar as Escrituras, mesmo os incrédulos e incapazes de entendê-las que têm ocupado esse cargo. A terceira, a pretensão de que só o papa podia convocar um concílio, quando na história muitos imperadores, começando por Constantino em Nicéia, o haviam feito. Lutero vê a mesma hierarquia eclesiástica como o pior inimigo da fé.- O Cativeiro Babilônico da Igreja. Este tratado afirma que o papado era o reino da Babilônia que havia levado cativa à Igreja, e algumas formas desse cativeiro haviam sido negar o cálice aos laicos, a transubstanciação (preferindo consubstanciação), a missa como boa obra, sacrifício e oferenda a Deus; reduz o número de sacramentos a dois: o batismo e a santa ceia, mas retém o de batismo às crianças. Neste documento Lutero recusa que se chame sacramentos a cinco dos tradicionais do catolicismo: crisma, penitência, matrimônio, ordenação e extrema unção.- A Liberdade do Cristão. Dirigida a modo de carta cordial a Leão X, pois tem sustentado que suas acusações não têm sido necessariamente contra a pessoa de Leão X senão contra o ofício de papado. Nesse tratado diz que um cristão é um homem livre, senhor de tudo e não sujeito a nada, e ao mesmo tempo é o mais obediente servo de todos, e está sujeito a todos, querendo significar com isso que o meio de alcançar essa liberdade é a Palavra de Deus e que a justificação só se obtém pela fé e não por merecimentos através de boas obras, que são métodos rudimentares nascidos no legalismo e nas disciplinas monásticas. Quando o homem se convence de que não pode salvar-se por obedecer as exigências dos mandamentos veterotestamentários, se volta às promessas de Deus em Cristo Jesus para o alcançar, exercendo a fé. Lutero diz que é uma insensata presunção procurar a justificação mediante obras. A fé honra a Deus e nos une a Cristo. Lutero afirma neste tratado que "as boas obras não fazem um homem bom, mas um homem bom faz boas obras; as obras más não fazem um homem mal, mas um homem mal faz obras más".Nestes tratados Lutero expunha o que Deus estava recuperando em Sua Igreja nesse momento conjuntural por meio dos reformadores: a justificação só pela fé, o sacerdócio de todos os crentes, a autoridade da Palavra de Deus como está registrada nas Escrituras, o direito e o dever de cada cristão de interpretar as Escrituras. Eles estavam convencidos de que tudo isso não era novo, senão a recuperação e confirmação do depósito histórico deixado por Deus à Sua Igreja antes que o cristianismo fosse corrompido pelo sistema babilônico. E isso só era o começo da recuperação do perdido. Aqui não parou tudo. O Senhor continuou o trabalho de restauração até nossos dias, como veremos mais tarde.

A Dieta de Worms

Em três de janeiro de 1521, a bula papal Decet Romanun Pontificem condena definitivamente a Lutero. Tendo em conta que o Santo Império Romano era considerado o braço político da comunidade cristã, o Estado não podia dar refúgio a um herege condenado pelo cabeça do sistema religioso, e em cujo caso quem lhe correspondia atuar era a Carlos V, recém eleito imperador, neto de Fernando e Isabel, os reis católicos Espanhóis. Mas condenar a morte a Lutero não era coisa muito simples por quanto alguns dos príncipes alemães estavam a seu favor, e o maior de todos, Frederico o Sábio, eleitor da Saxônia, na ocasião protetor de Lutero não propriamente por convicções evangélicas e sim por assuntos de ordem política e nacionalista, pois ele estava empenhado no bem-estar social e espiritual de seu povo, e não permitia que um alemão fosse condenado fora de sua pátria e sem que se escutassem sua causa. Contudo, e sem a total aprovação de Carlos V, Frederico consentiu que Lutero comparecesse ante a Dieta do Império, reunida na cidade de Worms em 17 de abril de 1521. Igual há um século antes havia sucedido com João Huss quando compareceu ante o concílio de Constança em 1415, também concederam a Lutero um salvo conduto imperial, e em abril se apresentou ante essa assembléia e ante o imperador, não sem que antes sofresse de desânimo e temor e até a tentação de renunciar a apresentar-se, de dar-se por vencido. E não era para menos. Um humilde monge e professor, correndo o risco de sua vida, enfrentando-se ante poderosas hostes satânicas representadas nesse momento pela autoridade constituída, tanto do poder eclesiástico como do Estado.Ali diante do imperador, os príncipes alemães, alguns teólogos e os legados papais, Marino Caraccioli e Jerônimo Aleandro, Lutero não negou que os livros amontoados no recinto haviam sido escritos por ele. . Enquanto que se retratava de quanto havia escrito, a melhor resposta a damos com as próprias últimas palavras do discurso pronunciado por Lutero: "Não posso nem quero retratar-me a menos que se me prove, pelo testemunho da Escritura ou por meio da razão, que estou equivocado; não posso confiar nem nas decisões dos Concílios nem nas dos Papas, porque está bem claro que eles não só se têm equivocado senão que se têm contradito entre si. Minha consciência está sujeita à Palavra de Deus, e não é honrado nem seguro obrar contra a própria consciência. Que Deus me ajude!. Amém".Apesar de que os legados papais pretenderam conseguir que fosse entregue à justiça, o imperador lhe permitiu sair de Worms. Devolta a Wittenberg, Lutero é seqüestrado por ordem de seu eleitor, Frederico de Saxônia, e trasladado ao castelo de Wartburgo na Turingia, a fins de protegê-lo contra as ameaças, enquanto se acalmam um pouco os ânimos. Ali permaneceu cerca de um ano, lapso no qual traduziu ao alemão o Novo Testamento, mas a Bíblia inteira em alemão se publica doze anos mais tarde. O imperador Carlos V promulgou um edito em Worms, decretando a Lutero como "um ramo cortado da igreja de Deus, um cismático obstinado e herege manifesto", fazendo-lo um proscrito, ordenando que se lhe nega-se toda hospitalidade e toda ajuda, que se lhe prendesse, assim como a seus seguidores, confiscando-lhes seus bens, e proibindo a compra de seus livros, algo que nunca se levou a cabo devido que Lutero contava com muitos simpatizantes, inclusive dentro do alto governo.

Nenhum comentário: